Recentemente, o uso do CAD e dos programas de renderização resultou em um entendimento novo da luz na arquitetura. Prancheta e luminária deram lugar à tela iluminada do computador. Como resultado, a concepção da arquitetura envolve a luz desde o primeiro clique. Na visualidade, os espaços luminosos predominam.
Isso, no entanto, levanta uma questão: a luminosidade (parte integrante das composições perfeitas renderizadas) tornou-se mais importante que a engenharia e a própria concepção arquitetônica? Com o destaque da relação de claros e escuros, sombras, contrastes e brilho, pode a iluminação na realidade obscurecer as simulações realistas?
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Enquanto a insolação pode ser esboçada com relativa facilidade, imaginar a interação de múltiplas fontes de luz em um espaço é algo mais complicado. Portanto, antes do novo milênio, os projetos de arquitetura costumavam ser representados sem a iluminação indireta, devido à falta de instrumentos para tanto.
No entanto, as ferramentas de renderização modernas podem mostrar a luz do sol claramente, e ainda incorporar a iluminação indireta em interação com as superfícies, gerando imagens com realismo fotográfico. Além disso, as fontes de luz virtuais podem ser manipuladas para calcular a luminância com precisão, o que permite a realização de análises qualitativas além de decisões estéticas. Mas mesmo as mais sofisticadas ferramentas possuem limites.
Ainda que os formatos High Dynamic Range (32-bit/HDR) ofereçam um constraste maior que seus precursores de 8-bit e teoricamente cubram todo o espectro de luz da natureza (de modo geral, o sol é 100.000 vezes mais brilhante que uma zona sombreada), a percepção de um render HDR perfeito na tela ou no papel ainda não se compara à atmosfera de um espaço real, já que uma imagem simulada não consegue transmitir a sensação de ofuscamento ou adaptabilidade lumínica.
Assim, o advento da mídia digital não apenas acelerou a produção de imagens como, apesar de inicialmente desconsiderado, fez surgir novos entendimentos do uso da luz - segundo as características (e limitações) de hardware e software. Particularmente, duas aproximações distintas à visualização emergiram: por um lado, o entendimento científico interessado na análise de dados quantitativos como garantia de precisão técnica; por outro, a vanguarda projetual, buscando a criação de atmosferas sutis e diferenciadas. Elas desenvolvem qualidades de luz sem restrições técnicas e "trapaceiam" nos detalhes de modo a comunicar convincentemente uma ideia aos clientes. Mesmo essa visão sendo menos comprometida com a realidade, ela pode de certa forma estimular a imaginação e tornar-se um valioso instrumento aos projetos inovadores.
Para Jeremy Birn, diretor técnico de iluminação do Pixar Animation Studios, "trapacear" com a luz é algo corriqueiro: "A trapaça é executada, em diferentes intensidades, em quase todo projeto feito em 3D... A luz em um personagem que parece vir de uma luminária pode na verdade vir de uma posição muito mais distante se ela for melhor para a cena". Para Jeremy, a iluminação e a cinematografia são artes, não ciências. Não importa o estilo, mas a credibilidade para o espectador. A maior exigência é a coerência, entre incidência, intensidade, sombreamento.
É claro, o desafio da arquitetura começa quando um cliente se agrada com a visualização imaginária e quer a realização do conceito.
Mas, a "trapaça" talvez seja melhor que a alternativa. Por exemplo, os vídeos se tornaram mais e mais relevantes na visualização da arquitetura, e ainda assim a tecnologia muitas vezes apresenta resultados insatisfatórios. A dinâmica espacial de simulações de iluminação requer um considerável poder de processamento computacional.
No caso do Graz Art Museum do realities:united, um projeto abstrato que utiliza uma complexa técnica de video mapping da fachada, a renderização foi restrita a um tratamento plano da fachada pixelada que excluía a iluminação indireta e a reflexividade. O simulador GreenPIX de Simone Giostra & Partners e ARUP analogamente reduziu os detalhes de iluminação para conseguir um processo de renderização mais rápido. O estudo NIX de realities:united, por outro lado, apesar de não ser particularmente realista em detalhes da iluminação, ao menos permitiu uma impressão dinâmica e diferentes perspectivas que demonstraram vividamente a interação entre a iluminação do interior e o efeito do ambiente urbano.
Então, talvez trapacear seja a melhor alternativa, uma vez que engloba a intenção do projeto, em vez de torná-lo raso. Qual a sua opinião sobre o assunto? É correto usar truques de iluminação nas representações arquitetônicas? As simulações de luz precisam ser exatas desde o início até o final do processo de trabalho? Ou a liberdade artística é preferível? Compartilhe sua visão nos comentários abaixo.
Para saber mais:
- Birn, Jeremy: Lighting & Rendering. New Riders, Berkeley. 2006.
- Ochoa, C.E., Aries, M.B.C. & Hensen, J.L.M.: State of the art in lighting simulation for building science: a literature review. Journal of Building Performance Simulation, 5(4), Pp. 209–233. 2012.
- Groß, Axel: Animation and digital lighting. PLD 2nd Global Lighting Design Convention, Berlin. 2010.
Light matters, uma coluna mensal sobre iluminação e espaço, é escrita por Thomas Schielke. Trabalhando na Alemanha, é fascinado pela iluminação na arquitetura. Para mais informações acesse www.arclighting.de ou siga @arcspaces .